Fronteiras 10 anos: Manuel Castells

Postado em out. de 2016

Internet e Redes Sociais | Governança | Social

Fronteiras 10 anos: Manuel Castells

Começando nova série em celebração aos 10 anos de Fronteiras, divulgaremos as respostas dos convidados às perguntas enviadas pelo público presente nas conferências ao longo desta década.


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Começando nova série em celebração aos 10 anos de Fronteiras, divulgaremos as respostas dos convidados às perguntas enviadas pelo público presente nas conferências ao longo desta década. Quem inaugura a série deste conteúdo, até então inédito em nossos canais digitais, é o sociólogo espanhol Manuel Castells, autor da trilogia trilogia A era da informação, que esteve no Fronteiras do Pensamento 2013.


O próximo nome da série #Fronteiras10anos depende de você.
Escolha abaixo e comente seu favorito em nossa página no Facebook.

- Camille Paglia
- Ferreira Gullar
- Alain de Botton

Confira as respostas de Manuel Castells ao público do Fronteiras Porto Alegre e São Paulo:

NOVAS GERAÇÕES E REDES SOCIAIS

“As redes sociais não são algo à parte na vida dos jovens. Os jovens vivem nas redes sociais, nas redes familiares, pessoais. São dimensões da vida dos jovens. Quando minha geração desaparecer, todos viverão nas redes sociais. Sempre comparo a internet à eletricidade. Na história, houve momentos em que apenas algumas pessoas possuíam eletricidade, mas ela é fundamental para a sociedade industrial. Na nossa sociedade, as redes sociais são a forma de comunicar, de existir, de fazer qualquer coisa.

Portanto, a questão é: qual a característica das redes sociais que favorece ou que dificulta a expressão dos jovens? Eu diria que há uma conexão entre a cultura da autonomia, que é a cultura fundamental da contemporaneidade, em relação às instituições e aos poderes da sociedade. É o seu meio próprio, é o meio dos jovens, que também é um meio de aprendizagem. E um dos grandes problemas de educação é que há uma contradição entre a pedagogia e a organização do ensino estabelecida historicamente através das formas verticais e burocráticas e a cultura da autonomia e da capacidade de cultura digital dos jovens. É totalmente contraditório.

Os estudos atuais sobre evasão escolar mostram que a razão pela qual os jovens saem da escola é porque eles se aborrecem na sala de aula, porque a sala de aula continua com formas de comunicação que não são as desta sociedade. Isso não é um problema dos professores, mas do tipo de organização – vertical tradicional.

A prática dos jovens nas redes sociais está reforçando a autonomia e a capacidade de redefinição cultural. No fundo, levando ao empoderamento dos jovens. É irônico que o país de Paulo Freire tenha esquecido a pedagogia da liberdade.

Há estudos sérios do British Computer Society que mostram correlação entre internet e felicidade. Que surpresa! Todos os meios de comunicação falam que a internet é perversa, mas há correlação comprovada entre a utilização da web e a felicidade. Por que isso? A internet aumenta a sociabilidade – inclusive a física – e o empoderamento. E quais são as duas variáveis mais importantes no estabelecimento da felicidade? A sociabilidade e o empoderamento."

REPRESSÃO AOS MOVIMENTOS SOCIAIS

“A repressão é a forma mais fraca de poder. É muito mais eficaz manipular as mentes do que torturar os corpos. O poder que precisa matar é um poder débil, fraco, erodido. O custo político dos sistemas que reprimem violentamente é tão alto e a capacidade de reconstruir legitimidade é tão lenta que a repressão violenta de grande escala é apenas exercida quando o sistema precisa absolutamente. Não é o caso dos países ocidentais hoje."

PRIVACIDADE NA REDE

“Não há privacidade na rede. Isso não quer dizer que não devemos defendê-la. Devemos fazer leis, mas tecnicamente elas não serão cumpridas. É muito fácil vigiar quando tudo está interconectado. Por isso, terroristas não utilizam a internet. A utilizam apenas como propaganda, mas suas mensagens são enviadas por pessoas a pé.

A web está totalmente controlada por todos os poderes. Isso sempre foi assim. Poderes controlam e vigiam os cidadãos. A diferença é que agora os cidadãos também podem vigiar os poderosos. Qualquer pessoa com celular pode capturar um poderoso fazendo algo errado. Temos menos tecnologia do que o poder, mas somos milhões e milhões de olhos vigiando alguns milhares de poderosos. Com isso, todos se vigiam mutuamente. Assim, há certo reequilíbrio.

O grande problema não é que o governo norte-americano vigie, e ele o faz mesmo que negue. O problema são as empresas de internet, as empresas comerciais. Sua vida profissional e pessoal está registrada no seu cartão de crédito. Se você quer privacidade, destrua seu cartão de crédito e faça como traficantes de drogas: pague em dinheiro vivo. É a única forma segura para que ninguém saiba com quem você dormiu, onde comeu, etc.

As empresas de internet passam os dados ao governo. Tudo que fazemos nas mídias está à disposição dos serviços secretos. Que defesa temos? Só uma: legislação dura e capacidade judicial de fazer com que essas leis sejam cumpridas. Enquanto tivermos capacidade de indignação e de mobilização contra práticas opressivas de destruição da privacidade, há uma esperança, conseguir leis e justiça para aplicação das leis. Isso depende da capacidade de mobilização política da sociedade."

REDES URBANAS

“Planejamento urbano é uma questão política. A grande questão de uma cidade é como resistir aos interesses das imobiliárias e construtoras. São os lobbies que destroem a qualidade de vida nas cidades. Alguém precisa planejar, claro, a questão é o controle e a participação da população neste planejamento social, ambiental, etc. Porém, não se trata de atacar um grupo industrial. O problema não está na indústria, mas sim na política. Está na capacidade dos partidos de serem independentes dos poderes econômicos e esta capacidade, em todos os lugares, está diminuindo."

CRISE DA LEGITIMIDADE POLÍTICA

“O que eu constato é um fato empírico: em todos os países, os cidadãos não se sentem representados. Inclusive, no Brasil. Isso não quer dizer que eles pensam que as eleições foram forjadas, não. Quando a eleição acaba, eles não se sentem mais representados. Isso nos últimos 10 anos vem aumentando. Constantemente, as políticas que são praticadas não correspondem às promessas de campanha. Também, não há canais de participação com a população. Com as redes digitais, seria possível criar sistemas de comunicação e transparência em que o cidadão teria não apenas acesso a documentos, mas que ele possa se conectar com outros cidadãos sobre isso. É o que muda agora: a sociedade pode se automobilizar e auto-organizar. Antes, se a população estava descontente, ela poderia apenas ir a manifestações organizadas por partidos ou sindicatos que negociavam em nome das pessoas. Mas, a auto-organização é espontânea e isso é novo e vem com as redes sociais. As pessoas, sem depender de instituições, podem se organizar, debater e intervir no espaço público."


Assista abaixo ao vídeo da conferência de Manuel Castells ao Fronteiras Porto Alegre e clique aqui para ver todos os vídeos com o sociólogo espanhol

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Manuel Castells

Manuel Castells

Sociólogo

Sociólogo espanhol, agraciado com o Holberg International Memorial Prize 2012. Castells é referência mundial na discussão das transformações sociais do final do século XX.
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