Janna Levin responde: como a ciência pode se aproximar das pessoas?

Postado em set. de 2019

Ciência | Mulheres Inspiradoras

Janna Levin responde: como a ciência pode se aproximar das pessoas?

Astrofísica norte-americana foi a convidada do Fronteiras no início de setembro e falou sobre a evolução da ciência sobre os buracos negros.


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A evolução da ciência sobre os buracos negros no universo foi o foco principal da fala da astrofísica norte-americana Janna Levin durante sua passagem pelo Fronteiras do Pensamento, no mês de setembro (02, POA; 04, SP).

Formada em física e astronomia pela Universidade de Columbia, onde leciona atualmente, Levin é Ph.D em física teórica pelo Massachusetts Institute of Technology (MIT). Além disso, é diretora de ciências do centro cultural Pioneer Works, em Nova York. Em suas pesquisas aborda o início do cosmos, buscando evidências de sua finitude. 

No Fronteiras, Janna Levin convidou a plateia a refletir sobre as grandes conquistas da física -- há três anos, foi possível ouvir pela primeira vez o som produzido pela colisão de buracos negros.

Em abril, vimos uma fotografia inédita de um desses intrigantes corpos celestes. Essa captação foi possível por meio da conexão de potentes radiotelescópios espalhados pelo mundo. Por mais que buracos negros não emitam luz, foi possível enxergá-lo no meio do anel de matéria brilhante que gira em torno dele. “São cerca de um bilhão de buracos negros em nossa galáxia. É por isso que é difícil acreditar que não exista vida em outros lugares”, defendeu Levin.

Lembre-se: o próximo conferencista do projeto é o cineasta alemão Werner Herzog, que chega ao Fronteiras no final deste mês (23, POA; 25, SP). Contardo Calligaris e Luc Ferry serão os próximos convidados, fechando o ciclo de conferências deste ano. Ingressos para Porto Alegre esgotados. Clique aqui para adquirir seu pacote para o Fronteiras São Paulo.

 

 
 
 
 
 
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Após sua conferência, Janna Levin respondeu as perguntas do público presente. Ainda, a pergunta enviada por vocês, nossos seguidores nas mídias sociais, que são patrocinadas pela Braskem. Confira as principais respostas de Janna Levin logo abaixo:

Pergunta Braskem: Atualmente, existe uma negação da ciência e há a atuação de grupos específicos, como os “terraplanistas”. Como a ciência poderia chegar ainda mais próximo das pessoas e evitar a disseminação de informações incorretas?

A ciência pode chegar mais próximo das pessoas como nós estamos aqui hoje. Este é um evento cultural, não é acadêmico, nem técnico, nem religioso; é uma conversa pública com pessoas inteligentes, espertas, que querem fazer parte das descobertas.  Este é o caminho de trazer a ciência próximo das pessoas.

Eu sei que nós estamos muito aborrecidos, que tem gente que acredita que a terra é plana (e tem que dar risada disso), mas a gente tem que lembrar que, quando Galileu estava olhando por um telescópio, ele foi para a cadeia e todos ficaram contra ele.

Eu acho nós precisamos ver que é uma pequena comunidade de pessoas que acham isso, que acreditam que a terra é plana. A maioria de nós está muito chocada e mortificada com essa informação.

 
 
 
 
 
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Se há outros fenômenos cosmológicos ou astrofísicos que estamos tentando observar e não conseguimos ainda, quais eles seriam?

Algumas das maiores perguntas com relação ao nosso entendimento do universo hoje envolvem 95% de tudo que está no escuro, que nós não enxergamos. Tem pessoas que acham que o buraco negro é a grande fração disso, mas eu não concordo. Eu acho que de uma parte, na forma de matéria e energia, nós não sabemos nada sobre isso.

As pessoas dão risada e dizem: “ah, você sabe tão pouco sobre o universo.” Mas é o oposto: nós sabemos tanto, que nós enxergamos que há um espaço negativo e escuro, pelos detalhes que nós apreendemos para reconhecer e perceber que todo mundo nessa sala e tudo que nós já vimos é só um pequeno resíduo que sobrou do Big Bang. E a maior parte poderia estar passando por nós, algo chamado matéria negra que é escura, invisível, você não consegue ver.

A questão é que a matéria escura está passando por nós em volumes, mas não interage conosco, e continua como se estivesse em um barco a vela no mar. Quem sabe nós estamos em uma tempestade de buracos negros e energia escura?! Eu acho que isso é uma coisa palpitante.

Outra questão é se nosso Big Bang foi o único, que eu acho que é pouco provável, porque agora sabemos que a nossa galáxia não é a única e o nosso sistema solar não é único.

As pessoas estão cada vez mais convencidas de que nós somos um milionésimo dentro do universo. A pergunta mais difícil: será que nós vamos ter alguma relação com esses universos, ou será que vai ser sempre teórico?  

A vastidão do universo e o imenso conhecimento que já possuímos sobre ele não seria um motivo para que cultivássemos cada vez mais a velha virtude da humildade - ainda mais em uma época em que o poder é exercido com soberba e beligerância - o limite da empatia não deveria ser o limite da vastidão do universo? Então, resumindo, você acha que os cientistas foram humildes tratando os dados e fazendo o anúncio da maneira que eles fizeram? 

A pergunta, se eu consegui entender, é sobre a humildade frente à grandeza do universo e a arrogância do ser humano intrínseca, sempre com muitos egos e todos querendo o poder? Eu acho que seria algo maravilhoso se nós conseguirmos pausar na vastidão do universo tempo suficiente para sentir a humildade.

Se você não gosta de seguir humilde, você pode ficar vendo a Amazônia pegando fogo e negar o aquecimento global, como nós vemos nos Estados Unidos todo mundo dizendo que é uma arrogância.

Os cientistas lutaram muito com seus egos e falaram sobre isso, eles lutaram com seus próprios egos, porque você de uma pessoa trabalhando no laboratório, ele com um instrumento de 1.3 metros ganhar o prêmio Nobel, parar tudo por 3 anos só para decifrar se é viável, depois fazer parte de uma equipe de 800 pessoas.... Olha, isso exige humildade e ego, e precisa ter um equilíbrio entre eles para você continuar, e você não pode estragar o projeto. Eu acho que nós temos que aceitar nossos traços humanos e fazer o melhor possível.  

Você escreveu um livro sobre buracos negros para o público geral, não para cientistas, depois que eles já tinham sido popularizados por outros autores, talvez o mais conhecido deles seja o professor Stephen Hawking. O que você acha do trabalho do professor Hawking escrito para o público leigo? Você tirou alguma inspiração dos livros dele para falar sobre os buracos negros para o público leigo?

Bem, há livros muito diferentes: alguns são educativos, outros são literários e outros são simplesmente inspiradores. Eu acho que o Hawking é desta categoria inspiracional, poucas pessoas conseguiram ler até o final.

O livro dele é mágico, porque ele não estava tentando explicar nada. É como você dar uma olhada em algo muito especial, como um voyeur, voyeurismo. Mesmo sem entender, você entendia o seguinte: que havia alguma coisa muito misteriosa que existia, e muito estranha e, ao mesmo tempo, real.

O Hawking era uma pessoa muito especial. O Stephen Hawking e o Kip Thorne eram muito amigos. O Kip Thorne, que ganhou o prêmio Nobel para o projeto LIGO, era muito amigo do Stephen Hawking. A última vez que eu encontrei com ele, ele estava com o Kip Thorne, e você imagina essa história, a mágica dessas pessoas, que foram os primeiros a pôr a mão na teoria da relatividade. Eu tenho inveja disso!  

Você está trabalhando em algum livro novo? Qual é o tema dele?

Os livros.... É tão difícil escrever esses livros. Todas vezes que eu escrevo um livro eu digo: “Quer saber? Eu nunca vou conseguir terminar”. E aí um dia você está sentada em uma cadeira aqui no Brasil falando de um livro. É difícil de acreditar.

Eu estou, sim, pensando sobre um livro. Eu achei que tinha escrito 20 páginas, daí eu encontrei 150 páginas.... Essas coisas acontecem. Eu estava lendo, estava tão feliz com esse livro, era um romance. Eu gostaria de terminá-lo um dia, mas, como escritor, você fica com medo que não vai conseguir mais escrever. Então, é um livro não terminado.

A ciência é semelhante a esse processo, sabe? Às vezes você pensa, bom, mas de onde veio essa ideia? Será que eu vou ter uma outra ideia assim na vida?

 

 

 

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Janna Levin

Janna Levin

Física teórica e astrônoma norte-americana

Autora de “A música do universo”, sua obra busca compreender buracos negros e ondas gravitacionais.
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