Enrique Peñalosa: uma cidade mais sustentável e amável

Postado em jan. de 2022

Sustentabilidade | Cidades Inteligentes | Governança

Enrique Peñalosa: uma cidade mais sustentável e amável

Em 2012 e 2013, o economista e urbanista colombiano esteve no Fronteiras do Pensamento falando sobre o processo de desenvolvimento das cidades, da necessidade de planejamento e de uma nova distribuição dos espaços.


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O economista e urbanista colombiano Enrique Peñalosa foi prefeito de Bogotá em dois mandados, o mais recente entre 2016 e 2019. Na época de sua participação no Fronteiras do Pensamento, entre 2012 e 2013, também presidia o ITDP, ONG norte-americana que presta assistência técnica no desenvolvimento de meios de transporte sustentáveis na Ásia, África e Américas.

Em seu primeiro mandato como Prefeito de Bogotá, entre 1998 e 2001, foi responsável por cinco megaprojetos: o banco de terras; o distrito dos parques (incluindo a Rede Bogotá de Ciclovias); o distrito de bibliotecas; o Transmilênio (sistema de transporte coletivo) e a construção e manutenção de estradas. Seus métodos pouco ortodoxos transformaram uma das capitais mais perigosas, violentas e corruptas do mundo em uma cidade hoje considerada modelo.

Retomamos alguns trechos desta entrevista exclusiva gravada para o Fronteiras do Pensamento. Ela está estruturada em diversos temas. Retomá-los é uma oportunidade de refletirmos o quanto evoluímos e o que ainda precisamos fazer. 

Há trinta anos, na América Latina, se falássemos de cidades, iríamos falar de necessidades para a sobrevivência. Estaríamos falando de como ter água potável, rede de esgotos...o mínimo do mínimo para sobreviver. Agora já estamos passando para uma segunda etapa: já não são as necessidades para sobreviver, mas sim as necessidades para sermos felizes. Do que necessitamos para sermos felizes?

Não basta somente ter água potável, mas sim ter acesso a parques, a atividades esportivas, a atividades culturais. Como ter um ambiente que seja belo e no qual nos sintamos bem? Que seja propício para o desenvolvimento mais pleno de nosso potencial e para a nossa felicidade? 

Via Principal 

Temos cidades há 5 mil anos, mas automóveis apenas nos últimos 80 anos. E os automóveis deformaram completamente as cidades. Por exemplo, antes dos automóveis, os ricos de uma cidade queriam que suas casas estivessem na via principal da cidade. Bastou chegarem os automóveis e saíram correndo! Abandonaram os centros das cidades, se afastando o máximo possível. As pessoas deixaram de se integrar. Foram se isolando cada vez mais as classes sociais, curiosamente…

Acredito que é possível que tenhamos cidades completamente diferentes. Com muito mais verde, com melhores espaços para pedestres, com melhor mobilidade. O que fizemos nos últimos 80, 100 anos é um enorme erro, que acredito será visto como um grande equívoco na história da humanidade. 

Pão de Carro 

Claramente, o principal problema das cidades do mundo moderno é que tenderam a estender-se, com baixa densidade, em função do automóvel e suas autopistas. As pessoas vão para cada vez mais longe. E, obviamente, são construídos ambientes nos quais as pessoas precisam do automóvel para comprar um pão, um leite. Nos quais as casas são grandes e consomem muita energia, com ar-condicionado, calefação. Nos quais estamos totalmente dependentes do automóvel. Mas, por outro lado, é claro que as pessoas não querem viver em um centro urbano tradicional, de cimento, concreto. Não querem uma Hong Kong ou Manhattan. Creio que há a oportunidade de se conceber uma cidade diferente, nova. Por exemplo, por que não pensamos em cidades onde tenhamos centenas de quilômetros de parques lineares. Que pudéssemos atravessar a cidade por meio de parques lineares com 50 metros de largura, com verde?

Uma rede de centenas de quilômetros onde as pessoas poderiam locomover-se em bicicletas, sem nenhum risco, em autopistas para bicicletas? Que projetássemos a cidade com redes de vias exclusivas para ônibus, para pedestres e para ciclistas, desde o começo?

Espaço e carro 

 O conflito não é somente pelo recurso, mas sim pelo espaço. O recurso mais valioso que tem uma cidade é o seu espaço para circulação. Poderíamos encontrar petróleo e diamantes embaixo de Porto Alegre, e ainda assim não seria tão valioso como este espaço de circulação, este recurso. Portanto, a pergunta é: como dividir este espaço de circulação entre pedestres, bicicletas, transporte público e carros? E esta não é uma decisão técnica. Não existe um nível “natural” de uso de um automóvel em uma cidade. 

Se houvesse mais espaço para os carros em Nova York ou Londres, haveria mais carros. E se houvesse menos espaço, haveria menos carros. Logo, esta é uma decisão política: como queremos distribuir este espaço? E, além disso, criar espaços distintos, onde claramente o ser humano viva sem o ruído, sem a ameaça dos veículos motorizados. Espaços totalmente diferentes daqueles que temos hoje. Realmente, acredito que estamos tão, tão, tão equivocados que é quase difícil consertar o que temos, quase nos toca repensá-lo de uma maneira muito diferente. 

Decisão

O tema da mobilidade, por exemplo, que é um dos que mais interessa aos cidadãos. A mobilidade é um tema político, não é um tema técnico. Se dermos faixas exclusivas para os ônibus em todas as ruas da cidade nas quais eles passam, em um mês resolvemos a questão da mobilidade de qualquer cidade. Mas é um tema de decisão política. Se tivéssemos ônibus excelentes, com ar-condicionado, vias exclusivas, limpos, com internet, ruas em boas condições, boas calçadas aos lados. 

Há muitas mudanças que podemos começar a fazer, já! Há áreas da cidade as quais é possível demolir e refazer, não é? É importante ter clareza de que as cidades não duram para sempre. 

Metrô 

Aqui o grande obstáculo para a mudança ainda é a desigualdade. A desigualdade é a principal causa dos problemas. Por exemplo, muitos cidadãos de alta renda da Colômbia e do Brasil sentem-se muito orgulhosos porque sabem utilizar muito bem o metrô em Paris ou Nova Iorque, e lá entram no metrô junto aos cidadãos mais pobres daquela sociedade. Mas jamais entrariam no transporte público de sua própria cidade, junto aos pobres de sua cidade. O que necessitamos é de uma cidade que se conceba para integrar todas as classes. 

Veja a entrevista completa.

 

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Enrique Peñalosa

Enrique Peñalosa

Economista

Economista e urbanista colombiano, foi prefeito de Bogotá entre 1998 e 2001, revolucionando políticas urbanas e transportes da cidade.
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