Postado em ago. de 2022
Educação
Fronteiras do Pensamento: curadoria para enfrentar o caos
A Temporada 2022 começou. Com seis conferências presenciais e outras seis online, o Fronteiras do Pensamento debaterá as transformações trazidas pela tecnologia
Enquanto a ecologia deixa de ser pauta exclusiva dos cadernos alternativos e toma conta das revistas de economia, robôs saem do mudo da ficção para invadir o mercado de trabalho e se fundir ao corpo humano. Embora ainda surpreendente para alguns, essa é uma realidade que avança em velocidade espantosa e irrefreável, transformando relações e colocando em xeque valores e condutas. Só para dar um exemplo, a União Europeia deixou recentemente de tomar o crescimento do PIB como norteador da economia. Desde 2019, o que comanda a agenda econômica é a meta de zerar de emissões de carbono até 2050.
Embora nenhuma plataforma de governo no Brasil tenha despertado para essa transformação, suas consequências em solo local são visíveis. Basta uma visita ao litoral gaúcho para se surpreender com o número de cataventos gigantes que se espelham desde Osório até nossas prainhas mais recônditas. Em pouco mais de 10 anos, e energia eólica saltou do zero para 12% da produção energética do país. É uma Itaipu e meia, silenciosa e descentralizada. A mudança verde vem sendo promovida não tanto por um avanço de consciência ambiental, mas porque gerar energia limpa se tornou mais barato e rentável. É a tecnologia ao lado da ecologia.
Mas o avanço tecnológico não tem trazido apenas boas notícias. A inteligência artificial e a robótica têm dispensado cada vez mais trabalhadores em diferentes setores, gerando instabilidade e insegurança. Além do mercado de trabalho, a democracia também tem sido ameaçada, pelas fake news e pela tendência de usuários de redes sociais se isolarem em bolhas, tornando quase impossível promover debates amplos por interesses comuns. Mais do que isso, a tecnologia se funde ao corpo e à experiência humana de modo cada vez mais visceral, levantando novas dúvidas sobre o significado e o sentido do ser humano.
Adaptar-se a essa nova realidade tem sido uma tarefa exasperante para muitos. Em um mundo globalizado, com mais de 2 milhões de podcasts disponíveis e mais de mil vídeos publicados na internet a cada minuto, buscar informação e orientação pode ser uma experiência frustrante, gerando sensação de caos. Nesse contexto, a curadoria é uma chave imprescindível para uma compreensão aguçada e libertadora dos processos em que se está inserido.
Para amparar e construir soluções ao lado de quem vive essas transformações, o Fronteiras do Pensamento chega a mais uma aguardada edição, desta vez promovendo 12 conferências com pensadores essenciais para entender nosso tempo. Com curadoria de Fernando Schüler, o evento propõe neste ano o tema “Tecnologias para a vida”, trazendo convidados da linha de frente nas principais discussões atuais.
O evento volta ao presencial em grande estilo, tendo como base a Casa da Ospa, em Porto Alegre, e o Teatro Claro, em São Paulo. Das 12 conferências, seis terão presença de público na sala sinfônica, e outras seis serão online. Entre os participantes, estão pensadores que tratam do impacto da inovação na vida cotidiana, promotores do debate sobre a economia verde, divulgadores do papel da ciência e psicanalistas que se debruçam sobre a busca de significado de vidas expostas a tantas transformações.
As conferências de abertura acontecem com dois pensadores que propõem uma revolução no modo como se ensina ciência. A brasileira Natalia Pasternak e o norte-americano Stuart Firestein têm participado de eventos apresentando um ensino que não dê respostas prontas, mas instiga a questionar.
Já o francês Frédéric Martel abre a discussão sobre tecnologia e cultura. Projetado para a fama internacional com o best-seller No Armário do Vaticano (2019), sobre a sexualidade na Igreja Católica, Martel é também autor de dois livros fundamentais para entender a indústria criativa contemporânea Mainstream: a Guerra Global das Mídias e das Culturas (2010) e Smart: o que Você Não Sabe sobre a Internet (2014).
O debate sobre inovação se aprofunda, com Steven Johnson, autor de livros que fundem neurociência, tecnologia e entretenimento, entre os quais De Onde Vêm as Boas Ideias (2010) e Cultura da Interface (1997).
Luc Ferry volta ao Fronteiras, desta vez falando sobre a relação entre ecologia e tecnologia. Depois de Ferry, em outubro, é a vez de sua conterrânea, a psicanalista francesa Élisabeth Roudinesco, que tem tentado desvendar como a fragmentação dos movimentos identitários está impactando a luta por direitos civis no mundo.
Para finalizar os encontros presenciais, em novembro, Marcelo Gleiser deve provocar o debate sobre o impacto da inteligência artificial nas relações de trabalho e em outras experiências humanas.
As conferências online estarão disponíveis em dois momentos. No primeiro, ciência e ecologia devem se destacar, com Sidarta Ribeiro, Mayana Zatz e Jorge Caldeira. No segundo, os debates abordarão psicanálise, cultura e inovação, com Maria Homem, Rodrigo Petrônio e Martha Gabriel.
Trata-se de uma oportunidade de mergulhar nos dilemas e contradições da contemporaneidade ao lado de quem melhor consegue interpretá-la. Mais do que respostas, será uma experiência de construir novas perguntas, capazes de instigar novas transformações na sociedade.