Na inovação, seremos ilha ou recife?

Postado em out. de 2022

Ciência | Medicina

Na inovação, seremos ilha ou recife?

A escolha está em nossas mãos: para inovar, em vez de atitudes isoladas, precisamos de colaboração, defende CEO do Hospital Moinhos de Vento, Mohamed Parrini.


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De onde vêm as boas ideias? As grandes descobertas que mudaram a vida, a cultura e a sociedade possuem um padrão possível de ser replicado?

Há mais de 10 anos, Steven Johnson publicou o já clássico De Onde Vêm as Boas Ideias, que se mostra cada vez mais atual. Ele ajuda a desconstruir pensamentos enraizados: para o autor, as grandes inovações criadas pela humanidade não resultam somente de prodigiosos talentos individuais. Ao contrário do que pensamos, as maiores invenções florescem em ambientes e condições específicas para isso – e talvez possamos replicar essas condições para o bem da humanidade.

O “normal”, em muitos momentos, é antagônico ao “novo”. E, quando os paradigmas são substituídos, a própria percepção do mundo é modificada. Mas isso apenas é possível através da conexão das pessoas e dos ambientes, a partir de um olhar inquieto, resiliente e universal.

Ninguém consegue construir algo sozinho. Em sua obra, Johnson apresenta o paradoxo de Darwin: em suas observações das ilhas Cocos, no Oceano Índico, o naturalista percebe a aparente contradição entre dois ambientes tão próximos. Em terra firme, a natureza parece mesquinha e pobre, com poucos atrativos. Já o recife de coral que compõe os atóis é um espaço exuberante de vida, com uma diversidade biológica fervilhante.

Como é possível haver tamanha discrepância? O filósofo parte desse exemplo para analisar conceitos relativos à inovação em nosso dia a dia, concluindo que a imaginação criativa do recife não se dá pela individualidade entre os organismos, mas justamente pela colaboração. Espécies diversas como o coral, a zooxantela e o peixe-papagaio emprestam e reinventam o trabalho uns dos outros. Um processo que ajuda a compreender esse esplendor biológico, mas, fundamentalmente, a fomentar novas ideias.

Não por acaso, algumas das maiores inovações da história surgiram, justamente, em ambientes propícios a essa troca de ideias, como os cafés do século 18, espaços formadores de intelectuais. Locais de conexão, de trocas e de inquietude, onde seus adeptos vivenciavam diversos pontos de vista e, a partir deste ecossistema, eram estimulados a olhar além do imaginável. Uma hipótese bem-humorada, mas não impossível, de dar ao café o crédito pelo iluminismo e pela aceleração do conhecimento.

Evoluímos dos cafés para locais como o nosso Centro de Inovação Atrion, lançado há menos de um ano e que já está com inúmeras frentes unidas em prol de um mesmo objetivo: resolver as problemáticas inerentes do campo da saúde. Sabemos que esse mercado necessita de um olhar diferenciado – e são fundamentais os pontos de vista e a experiência de inúmeras disciplinas: engenharia, matemática, medicina, TI, entre outras. Esses são terrenos férteis para fomentar inovações. Boas ideias precisam dessa troca constante e não podem ficar confinadas em caixas onde são incapazes de florescer. Precisam ser compartilhadas e conectadas a outros olhares capazes de aperfeiçoar seu desenvolvimento.


As plataformas atraem e fortalecem ideias que contribuem não apenas para os nossos pacientes, mas também para qualificar os serviços de saúde em todo o país. E fazemos isso sem um olhar estanque dentro da instituição em si, mas abertos às diferentes visões, gerações e perfis, que podem se somar à medicina tradicional. Trata-se de mais um capítulo de uma história quase centenária que possui, em sua essência, a inovação – compromisso que se faz presente desde a nossa inauguração, em 1927, ainda como Deutsches Krankenhaus.

Esse esforço, afinal, vai além de nossos próprios terrenos. Como o coral de Darwin, a inovação prospera com essa relação simbiótica entre diferentes espécies. Nesse sentido, áreas das mais distintas podem se aprimorar numa relação compartilhada, levando-nos a encontrar respostas que não esperávamos ou sequer procurávamos. Algo, como definiria Johnson, que passa por abraçar e estimular a serendipidade, processo que abre portas para algo que não tínhamos percebido.

Em termos práticos, criar esse ambiente exige uma série de ações: mais liberdade para que indivíduos e empresas criem, empreendam e compartilhem ideias. Mais profundidade, pois é a partir do esgotamento e da complexidade de um tema que as evoluções surgem. Mais flexibilidade e adaptabilidade, porque precisamos ser líquidos para que a mudança ocorra. E, não menos importante, as ideias precisam estar conectadas, fazendo das escolas, instituições e universidades nascedouros de cidadãos capazes de unir passado e futuro, desenvolvendo a sociedade, a economia e a ciência.


E de onde virão as boas ideias do amanhã? A resposta passa pela vontade e pelo sonho, e estamos aptos a conquistar tudo que merecemos e desejamos. Mas precisamos querer, construindo as bases para que elas surjam. Seremos a ilha isolada do mundo, tão seca e pequena em sua diversidade ou seremos o recife de coral, rico em vida, profundo, dinâmico, e, sobretudo, unido e colaborativo? O futuro nos dirá.

O artigo foi escrito por Mohamed Parrini, CEO do Hospital Moinhos de Vento, e publicado, primeiramente, no Caderno DOC do Jornal Zero Hora. 

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