Sete caminhos para a humanidade se reconciliar com o planeta

Postado em out. de 2022

Sustentabilidade | Filosofia

Sete caminhos para a humanidade se reconciliar com o planeta

Para o filósofo Luc Ferry, desenvolvimento sustentável é uma falácia. Há outras formas de salvar o mundo em que vivemos.


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Para Luc Ferry, não faz mais sentido falar de ecologia no singular. Na noite de 19 de setembro, em São Paulo, durante a mais recente edição do evento Fronteiras do Pensamento, o filósofo francês discorreu sobre as sete correntes filosóficas da ecologia política, tema de seu novo livro, publicado na França sob o título Les Sept Écologies.

Ainda sem tradução no Brasil, a obra contém análises sobre a evolução do tema ao longo dos últimos 40 anos. “Os movimentos que a reivindicam são múltiplos e opostos entre si”, argumenta.

Um dos filósofos franceses mais lidos da atualidade, ele publicou mais de 70 livros, nos quais traz as questões da filosofia para o cotidiano. Nos últimos anos, Ferry tem se dedicado a pensar nos assuntos que envolvem meio ambiente, por considerar que no mundo atual esse é o tema mais urgente e que desperta mais paixões.

“Ninguém sensato nega o aquecimento global. Sabemos que a poluição dos mares é algo grave. Então, temos que fazer algum movimento no sentido contrário, rumo a uma transição ecológica”, diz. Instigante, interessante, original, Ferry não esconde defender uma dessas sete correntes, o ecomodernismo.

Veja um resumo da exposição de Ferry sobre as sete correntes da ecologia.

1 - Catástrofe inevitável
A primeira das correntes estudadas pelo francês é o catastrofismo ou colapsismo, de acordo com o qual o mundo como o conhecemos acabará em 2030, em razão das mudanças climáticas e da deterioração das condições de vida, principalmente da parcela mais pobre da população. Após o cataclisma, restará à humanidade se organizar em microrregiões. Será uma ruptura total com a globalização e com a maneira como somos hoje organizados em termos de política, economia e sociedade.

2 - Decrescimento
A segunda é a corrente do decrescimento, que defende que seria desejável que os países parassem de incentivar o crescimento da economia, tendo como meta interromper o lançamento na atmosfera dos gases que causam o efeito estufa e potencializam as mudanças climáticas. Baseada em ganhar menos dinheiro, a corrente tem pouquíssimas chances de prosperar, segundo o próprio filósofo.

“Nenhum dos 193 países-membros da Organização das Nações Unidas (ONU) adotaria o decrescimento como objetivo”, afirma. “Principalmente neste momento de pós-pandemia, todos querem o retorno do crescimento, ou seja, querem vender mais, consumir mais.”

3 - Ecofeminismo
A terceira seria o ecofeminismo, que se baseia na premissa de que os mecanismos do planeta foram construídos sobre ideias implantadas principalmente por homens brancos ocidentais. “Em resumo, é uma reação ao macho capitalista opressor”, explica Ferry.

Seria uma espécie de revolução ecológica liderada pelas mulheres, que abrangeria ainda um olhar mais atento sobre a maneira de tratar os animais. A jovem ambientalista sueca Greta Thunberg seria uma representante dessa linha filosófica.

4 - Descolonização
Semelhante à anterior, a descolonização prega também a oposição ao opressor. No caso, os colonizados se voltando contra os colonizadores. O francês incluiu um adendo na conferência original para comentar que no Brasil poderíamos encontrar defensores legítimos, em razão do passado atrelado a Portugal, assim como nos Estados Unidos, em sua relação com o Reino Unido.

5 - Veganismo
Ainda na mesma linha, segue a corrente vegana, composta por pessoas que não consomem nenhum produto de origem animal ou que tenha sido testado em bichos (ou “indivíduos não-humanos”). Os animais seriam os oprimidos pelo ser humano, que se considera figura primordial no planeta. O filósofo, que chama os veganos de “fundamentalistas verdes”, diz: “Não compartilho dessa visão tão restrita, embora eu ame os animais. Sou apaixonado pelos meus gatos, por exemplo.”

6 - Desenvolvimento sustentável
A sexta é a corrente dos reformistas, que acreditam no chamado desenvolvimento sustentável. Luc Ferry desacredita da eficiência das medidas propostas por essa corrente.

Entre os exemplos de ações estão a recomendação feita aos europeus de que se transportem de trem, evitando avião, para trajetos de até 400 quilômetros. Ele questiona ainda as soluções propostas nas conferências da ONU para o clima, como a transição energética, que deixa para trás os combustíveis fósseis. “São soluções pífias, lentas demais, que não provocarão mudanças significativas na velocidade que precisamos”, ressalta.

7 - Ecomodernismo
A corrente defendida pessoalmente pelo filósofo é a do “ecomodernismo”. A linha de ação é composta por duas frentes: regeneração e economia circular. “Os governos deveriam tornar a reciclagem obrigatória”, diz Ferry. E às empresas seria dada a oportunidade de cuidar do reflorestamento.

“Somos 8 bilhões de habitantes no planeta hoje, morando em cerca de apenas 10% do espaço disponível. A ideia é usar os demais 90% para fazer ressurgir uma grande biodiversidade, essencial para a manutenção da vida”, diz. “E quem acha que isso vai acarretar custos, está enganado. É barato e possível. Atenção aos empresários: a reciclagem e a economia circular farão vocês ganharem muito mais dinheiro!”

Ferry não descarta a possibilidade de que elementos de duas ou mais correntes possam ser combinados. Ele se alinha à tese apresentada no livro Planeta Vazio - O Declínio Chocante da População Mundial, de Lee Tang, que defende que a distopia da superpopulação na Terra não se concretizará. O mundo estaria, na verdade, caminhando para a redução populacional. A crescente urbanização, o alto custo de manter filhos, a tendência das mulheres em ter menos crianças e a perda de influência das religiões explicariam o fenômeno.

Ele delineia como ideal, no entanto, a busca por uma vida plena, mais simples e menos estressante. “Seria ótimo se pudéssemos fazer tudo localmente, com deslocamentos mínimos, de no máximo 15 minutos, a pé ou de bicicleta.” O filósofo argumenta, por fim, que não tenciona fazer “pregação verde”, mas apenas lançar ideias para reflexão. A alternativa ecomodernista teria como objetivo “esboçar um projeto inspirador de reconciliação da humanidade com o planeta.”

 

Lúcia Helena de Camargo é Colaboradora da HSM Management, publicação para a qual escreveu este artigo. 

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